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Gosma ou vidro lunar? Entenda o mistério em foto de missão chinesa no lado oculto da Lua

Imagem da suposta "gosma lunar" — Foto: CNSA/CLEP/Moriarty
No comecinho do ano, a sonda chinesa Chang’e 4 fez história ao pousar com segurança no lado oculto da Lua. Foi um momento histórico na exploração espacial, pois isso nunca tinha sido feito. Logo depois do pouso, no dia 3 de janeiro, o módulo Chang’e 4 liberou um jipinho lunar chamado Yutu 2 que começou a trafegar pelas imediações.

O problema em se conseguir efetuar uma missão dessas com sucesso está no problema básico das comunicações, ou a falta delas no caso. Todos os pousos na Lua, tripulados ou não, ocorreram no lado visível, ou seja, o seu lado mais próximo. Como a Lua tem sua rotação sincronizada com a sua translação ao redor da Terra, ela mantém sempre a mesma face voltada para nós. O lado oposto é o lado oculto e muitas vezes chamado de lado distante.
Foto tirada pela missão chinesa durante a aproximação — Foto: CNSA/CLEP/Moriarty
Veja que é bem diferente de lado escuro, como muita gente usa de forma errada. É claro que a Lua tem um lado escuro, que vai mudando conforme ela vai mudando de fase. Mas associar o lado oculto (ou distante) ao lado escuro é errado. Na Lua Nova, por exemplo, o lado visível da Lua é o lado escuro dela.

A escolha pelo pouso apenas no lado visível da Lua é sobretudo pela comunicação direta, ou seja, estando na linha de visada, é possível estabelecer uma ligação entre a sonda e a base na Terra via rádio. Isso fica impossível de se fazer com uma sonda no lado oposto, pois temos Lua bloqueando a ligação. Para se enviar (e receber) dados para o lado oposto da Lua é preciso estabelecer uma estação de retransmissão que tenha visada tanto para a base quanto para a sonda.

Isso foi feito pela China no final de maio de 2018, com o lançamento do satélite Queqiao, que em chinês quer dizer “ponte das pegas”, uma variedade de pombo. Com o posicionamento deste satélite a comunicação com o lado oculto da Lua ficou possível e assim a Chang’e 4 pousou.

O Yutu 2 começou a passear no entorno do módulo de pouso e em julho último encontrou algo intrigante dentro de uma cratera. Uma das fotos enviadas para a Terra mostrava uma mancha escura em meio ao terreno mais claro do fundo da cratera. Quando um dos técnicos da missão disse que o Yutu tinha encontrado um material gosmento, como um ‘gel lunar’ na sua definição, o interesse por essa descoberta escalou a níveis estratosféricos.

Como assim gel na Lua?

A China não tem a prática de deixar seus dados disponíveis a pesquisadores de outros países. Aliás até as fotos que são divulgadas vêm pelos canais de divulgação, tipo as redes sociais da agência espacial. E dessa maneira as fotos são de baixa resolução, sem qualidade para fazer uma análise mais profunda. Ainda assim, o pesquisador da NASA do Centro Espacial Goddard Daniel Moriarty resolveu olhar essas fotos com cuidado.

O Yutu 2 fez dois conjuntos de imagens, sob diversas condições de iluminação e posicionamento das câmeras. Aliás, o primeiro conjunto foi usado para avaliar se o jipe poderia entrar e sair da cratera com segurança e assim fotografar a tal mancha bem de perto. As imagens mostram de fato uma mancha mais escura, em relação ao terreno ao seu redor, mas é possível ver pontos mais brilhantes no meio da mancha.

O que seria, então, esse material?

De acordo com Moriarty, o material escuro é originário de impactos de meteoros na superfície da Lua, que deve ter trazido material do subsolo para o fundo da cratera. O aspecto deste material é fragmentado em pequenos pedaços, muito parecido com as amostras recolhidas Harrison Schmitt, geólogo e astronauta da missão Apollo 17.

A amostra foi coletada por Schmitt exatamente pelo seu contraste de cor com o seu entorno e por parecer pequenas bolinhas de vidro refletindo luz. A melhor explicação para esse fato está no impacto de meteoros no passado, que além de revolver o material da superfície, produziu fragmentos de vidro por aquecimento. Sim, com o impacto violento de rochas contra a superfície, o material composto sobretudo de silício se derrete formando fragmentos de vidro. A grande similaridade entre a aparência da amostra e a aparência da mancha fez com que Moriarty apontasse a mesma explicação.

Nos momentos de maior aproximação do jipe, ele acionou seu espectrômetro visível e infravermelho que tem a capacidade de analisar a composição química de uma amostra. Infelizmente, esse não é um tipo de informação que seja compartilhado em rede social, então deve demorar um pouco para sabermos do que se trata realmente. Mas, ao que tudo indica, gel não deve ser.

A China deve fazer outra investida na exploração lunar no meio do ano que vem. Está programado, ou menos planejado, o lançamento da sonda Chang’e 5. O grande atrativo desta missão será a coleta de amostras do solo lunar, pelo menos 2 kg, para enviar à Terra. Isso foi feito pela União Soviética na década de 1970 e a última missão a faze-lo foi a Luna 24 em 1976. Depois dela, a Chang’e 6 deve fazer o mesmo nos anos seguintes, em preparação para a colonização da Lua nos anos 2030.








Cássio Barbosa | G1

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