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Rios da península Ibérica

Por Arthur Soffiati

A península Ibérica pode ser entendida como uma pequena Europa dentro da média Europa, que, na verdade, é uma grande península da Ásia. É mais correto entender Europa e Ásia como um só continente, a Eurásia. Enquanto província hídrica, a Península Ibérica é irrigada por rios que não podem provir de fora dela nem sair dela, pois a cordilheira dos Pirineus ao norte, funciona como um grande divisor de águas a separá-la do restante da Europa. Assim, esses rios nascem no seu interior e desembocam no oceano Atlântico aberto ou no oceano Atlântico fechado, conhecido como mar Mediterrâneo. Os maiores rios ibéricos são o Tejo (1007 km),  o Ebro (910 km), o Douro (897 km), o Guadiana (744 km), o Guadalquivir (657), o Júcar (498 km), o Genil (337 km) e o Segura (325 km). Nunca se pode entender uma bacia hídrica sem o relevo, pois o curso de um rio é definido pelas altitudes. A regra geral é um rio ter nascente em terreno alto e desembocar em outro ou em seu destino final em ponto mais baixo. O relevo também determina a natureza do curso: fluxo lento ou rápido; quedas d’água ou fluxo não acidentado. O mapa abaixo combina relevo com bacias hidrográficas.

Um rio deve ser avaliado em seu contexto.O Tejo é o maior rio da Península Ibérica em seu contexto territorial. Se comparado aos rios da América do Sul,os rios da península da médios e pequenos. O rio Paraíba do Sul é maior que ele, com seus aproximadamente 1.100 kn de extensão. A faixa costeira da península é baixa. Situa-se entre 400 e 0 metros, com exceção do Ebro, que corre quase todo numa depressão perpendicular e inclinada à costa. Os pontos mais altos estão no interior do território. Em torno deles, situam-se os maciços e as mesetas. 

Cabe observa também a vegetação original que cercava esses rios. Eram florestas e campos temperados, com fauna nativa da Europa. Eram rios lindos do ponto de vista ecológico  e estético. No mapa abaixo, sem os traços do relevo, observam-se as grande bacias hídricas da península. Apenas os Pirineus estão nomeados e aparecem como o grande divisor de águas dessa pequena Europa. Ela corresponderia ao Sudeste do Brasil, com rios correndo para à direita e para à esquerda em direção ao mar. Grande parte dos rios dessa região brasileira são maiores que os rios ibéricos. 

A ocupação da península Ibérica por humanos é bastante antiga. Saindo da África, o Homo sapiens se espalhou pelo mundo. Já na fase paleolítica da história, grupos humanos ocupavam grande parte da Europa. Na fase neolítica, após a última glaciação, a península também abrigava grupos humanos que já viviam da agricultura e do pastoreio. Atividades econômicas que permitem o sedentarismo modificam mais o ambiente que atividades extrativistas para fins de subsistência.

Os gregos conheceram a península, como demonstra o Uma obra poética do latino Avieno, que viveu no século IV a.C., narra a viagem, provavelmente empreendida pelo cartaginês Himilcan no século V a. C. (Orla marítima. Introdução, tradução do latim e notas de José Ribeiro Ferreira. Coimbra: Centro de Estudos Clássicos e Humanísticos da Universidade de Coimbra, 1985). A península foi incorporada pelo império romana e foi transformada num província dele. Ruínas de cidades romanas e pontes são encontrada ainda hoje. Um bom exemplo são as ruínas de Coníbriga, perto de Coimbra. 

Povos periféricos ao Império Romano começaram a se penetrar nele pacificamente ou de forma hostil. Era chamados de bárbaros, palavra derivada do grego que significa aquele que balbucia feito criança. Ou seja, aquele que não fala a nossa língua. Parte da atual França e grande parte da península Ibérica foram ocupadas pelos visigodos. Nas terras correspondentes aos atuais Portugal e Galícia fixaram-se os suevos. Ao norte da atual Espanha, instalaram os bascos. Vários reinos cristãos se formaram no território ibérico. No século VIII d. C, a península foi invadida pelos muçulmanos, que instalaram nela o califado de Córdoba. A expansão dos mouros ocupou quase toda a península e ameaçou o império carolíngio fundado por Carlos Magno, na atual França.

Os contatos de judeus, cristãos e muçulmanos foi intenso. Foi uma época de grande prosperidade econômica e cultural. Cidades foram construídas. O ambiente foi bastante modificado, mas não a ponto de suprimir a vegetação nativa e provocar a extinção de espécies. Em forma de cruzada, os cristãos travaram uma luta de 700 anos para expulsar os muçulmanos. A luta chegou ao fim em 1392, quando os reis da Espanha patrocinaram a viagem de Cristóvão Colombo que chegou à América. Dois países se constituíram na península. A Espanha resultou da união de vários reinos de línguas aparentadas. Portugal falava uma dessas línguas e se formou como o segundo país.

Do século XVI aos dias atuais, Espanha e Portugal foram muito urbanizados, seguindo o padrão das civilizações: cidades junto a rios. Isso implica em grandes transformações: pontes, barragens, desvios, captação etc. A agricultura e a pecuária se expandiram, o que significa avançar sobre ecossistemas nativos e transformar alguns animais silvestres em inimigos, como javalis e lobos. Mas não apenas. Rios foram canalizados. Centrais para geração de energia nuclear foram instaladas em suas margens, assim como indústrias poluentes. Ferrovias e rodovias cortam hoje a península toda. 

As cidades se tornaram cada vez mais sedentas. O consumo tende a ser maior que a oferta. O regime hídrico foi alterado. O rio Tejo, por exemplo, já apresenta estiagens extraordinária. Várias são as barragens em seu curso e no de seus afluentes. O rio Zezere é exemplo desse aproveitamento abusivo dos rios. A língua salina já penetra quilômetros adentro do rio. O Douro é outro exemplo. Ele foi todo segmentado por barragens. O Minho, o Douro, o Lima, o Tejo e o Guadiana são rios internacionais. Eles nascem na Espanha e desembocam em Portugal, o que leva a um tratamento diferenciado de suas bacias. Por mais que se busca um gerenciamento conjunto, um rio acaba recebendo dois tratamentos, como acontece com alguns rios do Sudeste brasileiro por conta dos estados que se organizaram em suas bacias. As barragens e as transposições são um grande problema para os fluxos e a fauna aquática.

Hoje, quem visita os rios da Península Ibérica notará que eles conservam beleza turística, mas apresentam problemas nem sempre percebidos por uma observação superficial. As vazões oscilam muito. Na estação da chuvas eles podem ganhar grande volume repentinamente e provocar inundações, como é comum no rio Mondego. A escassez também se tornou comum, como no rio Guadiana. Espanha e Portugal já sofrem com a escassez para o abastecimento público. 

  Rompimento de diques no rio Mondego com sucessiva inundação

As mudanças climáticas estão causando efeitos danosos ao ambiente natural e construído. O norte da península é bastante chuvoso, o que não exclui as estiagens severas. O sul tem sofrido mais com as secas. 

Existem ainda problemas com esgoto e lixo lançados nos rios, remoção da vegetação nativa marginal, invasão de plantas. Os rios foram domesticados. Eles apresentam beleza como maquiagem, mas não saúde estrutural.


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