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Você pode ter direito a uma indenização e nem sabe

No Rio, em 10 anos, consumidores se habilitaram a receber valores devidos em apenas 4% das 107 ações coletivas  

RIO - Muitos cariocas foram surpreendidos quando o valor das passagens de ônibus no Rio de Janeiro foi reduzido em 2017. E milhares de servidores Brasil afora, correntistas de 23 bancos diferentes, também estranharam a notícia de que havia sido depositado em dobro o valor das mensalidades do crédito consignado descontado indevidamente de sua conta-corrente. Imagine o susto que vão levar os correntistas quando começarem a receber de volta o valor de uma taxa cobrada indevidamente pelos bancos, a chamada comissão de permanência, de empréstimo pago em atraso.

Essas vitórias são resultado de ações das Promotorias de Justiça de Tutela Coletiva de Defesa do Consumidor do Ministério Público do Rio. Ao todo, em uma década, entre 2009 e 2019, as promotorias da capital fluminense ajuizaram 508 ações civis públicas. Desse total, 340 já alcançaram decisões favoráveis. Em 107 delas, o consumidor faria jus a indenizações individuais. No entanto, só em 4% desses casos houve habilitação do cidadão para receber o valor devido.

Ao todo, entre decisões de ações definitivas e ainda em curso, e Termos de Ajustamento de Conduta (TAC) firmados judicialmente e fora dos tribunais, mais de R$ 17,4 milhões foram recuperados e revertidos para a sociedade pelas promotorias do consumidor por danos coletivos nos últimos dez anos.

— Além das indenizações coletivas, passado um ano, se ninguém se habilitar na ação, o MP executa esse valor, que será destinado a fundos públicos que financiam ações de defesa do consumidor — explica Christiane de Amorim Cavassa Freire, coordenadora do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça de Defesa do Consumidor do MPRJ.

Portal lista vitórias

A baixa adesão dos consumidores é um dos desafios enfrentados pelas promotorias, diz Christiane.

— Há grande dificuldade de fazer com que o resultado dessas ações seja informado a cada um dos consumidores que tiveram o problema. Por meio do portal Consumidor Vencedor, que reúne ações de MPs de todos os estados, tentamos mitigar essa falha. Listamos de forma simples, sem juridiquês, as ações em curso, as vitórias e aqueles processos que geram indenizações individuais, marcados com um saquinho de dinheiro.

Segundo Christiane, outro fator responsável pela baixa adesão é o tempo de tramitação das ações coletivas:

— Uma decisão definitiva pode demorar mais de cinco anos. Passado tanto tempo, o consumidor pode não ter mais o comprovante de que sofreu aquele dano ou simplesmente ter perdido interesse no caso se o valor a ser recebido não for alto.

Professor de Direito do Consumidor e ex-diretor do Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor (DPDC) do governo federal, Ricardo Morishita defende que seja obrigação das empresas localizar o consumidor e ressarci-lo pelos danos:

— O fornecedor deve ter a responsabilidade de localizar e indenizar os consumidores lesados. O consumidor é dele. E hoje, com a tecnologia, como a usada nas notas fiscais eletrônicas, não é difícil identificar esse cliente. A importância de garantir a indenização individual, além da coletiva, é gerar um ônus que desincentive as empresas a cometerem ilícitos.

Morishita destaca ainda a importância das ações coletivas para a sociedade:

— As ações coletivas são fundamentais na defesa do consumidor. São elas que consolidam e concretizam limites de atuação dos fornecedores.

O ministro Herman Benjamin, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), lembra que, nos Estados Unidos, as empresas são obrigadas a fazer divulgações como as de recall em veículos de grande circulação, como jornais, rádios e televisões, para garantir ampla conscientização da sentença.

O ministro, no entanto, vai além e diz que é preciso mudar a cabeça dos juízes para que as ações coletivas ganhem de fato o papel que merecem no Judiciário:

— Quando fizemos o Código de Defesa do Consumidor, mudamos a lei, considerada até hoje uma das mais avançadas do mundo, mas não foi o bastante. Esquecemos o elemento humano. E os juízes ainda hoje preferem cuidar mais de ações individuais do que das coletivas, muito mais complexas.

Mudança de cultura

Como diretor-geral da Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados, Benjamin acaba de lançar um curso sobre ações coletivas, na tentativa de mudar a cultura dos juízes. Mas não são só eles que precisam mudar, diz o ministro:

— Os juízes são pressionados pelos índices de produtividade das Corregedorias, que, erroneamente, aplicam o mesmo peso a processos individuais e coletivos, apesar de ser possível julgar 40 do primeiro tipo em duas semanas e um coletivo no mesmo tempo. A diferença é que com uma ação coletiva atingimos milhares de pessoas.








Fonte: O Dia Online

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